sexta-feira, 3 de agosto de 2012

What did i do to deserve this?

The pigeon superstition

Inerte como uma estátua, estatelado ao chão com os olhos vazios a focar o nada. Frio como gelo e pálido como a neve. Lentamente começo a tomar consciência do mundo a minha volta, como se tudo fosse ganhando suas formas e focalizando na vista antes embasada.
Ainda zonzo não ouso me mover, e aos poucos começo a sentir o resto do corpo. Tudo ainda gira e a memória está levemente entorpecida, presa dentro de uma névoa que não permite discernir direito o passado ou distinguir a realidade do imaginário.

A medida que os nervos e terminações vão se ativando pequenos espasmos percorrem meu corpo, uma leve e doce dor sobe pela minha coluna. Os olhos ainda presos ao nada tentam enxergar, mas sem sucesso. Sem forças para me mexer sinto um peso sob os ombros que vagarosamente vai se desmanchando, não dói, apenas é suave demais, quase saboroso, e por isso mesmo estranho.
Neste momento sou meu observador, como um transeunte que para para admirar uma mancha negra no chão. Me vejo, e do alto não pareço uma boa visão.
O ambiente escuro, as luzes a rodopiar, os ossos retorcidos, o corpo inerte... Se fosse capaz de olhar para o lado poderia ver a poça que se formava e já coagulava à minha volta. Mas sinto! Sinto tudo isso a minha volta como se observasse e como se vivenciasse. O fluir vagaroso e suave da vida em uma nascente vermelha, a dor forte e angustiante no peito contrastando as sensações. Me confundindo e esclarecendo ao mesmo tempo.

O peso diminui, a sensação de não sentir aumenta, quase como o estado anterior de inconsciência, mas agora com a certeza de que será definitivo.
Não sinto medo. Sinto prazer! Chegando e indo, animando como nunca antes tinha sentido me animar. Se o coração pudesse estaria disparado de excitação no momento, pois uma sensação nova despertava e novos olhos viam as coisas, mesmo que os olhos reais não se movimentem.
Umas gramas a mais do peso se vai, e com isso a mente se abre um pouco mais. A sensação de falsa liberdade começa a tomar conta do corpo e logo o velho hábito se dispara:

"What did I do to deserve this?"

Não revoltado e nem insatisfeito... Apenas a sensação estranha de que o alívio está próximo e a perspectiva de viver sem dor o assusta mais do que a dor em si o angustia. Depois de tanta coisa saindo dos eixos o que teria feito para merecer tal recompensa?

Só um pensamento: What did i do to deserve this?



PS: Essencialmente egoísta.

3 comentários:

  1. Já me peguei várias vezes pensando se quando for o momento vou ter tempo de pelo menos fazer esse tipo de pergunta. Ter consciência de que estou indo ou ir sem nem ao menos chegar a saber. Não sei, não sei...
    O texto... Muito bom... Muito bom mesmo!

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    1. Quando penso sobre isso eu lembro de uma experiência que tive. E posso lhe dizer que não é algo que dê para pensar muito sobre assuntos complexos.
      Lembro que meu primeiro e único pensamento que passou pela minha mente no momento foi "Putz... Perdi a prova de hoje!" (Chega a ser cômico, mas só consegui mesmo pensar na preocupação imediata. rsrs).

      Obrigado mesmo Nana. ^^
      Vou continuar me esforçando em escrever cada vez melhor. Apesar de que a cada vez que releio meus textos chego mais ainda na conclusão de que sou uma pessoa que só escreve bem se estiver sob forte influência emocional, e que depressão é o que melhor dá resultados. rsrs
      Textos com ar mais "dark" devem ser o melhor para mim, para serem de minha autoria.

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  2. É uma experiência engraçada quando releio e vejo as pequenas dicas que deixo espalhadas nos textos e que somente eu conseguiria entender e identificar, como o "PS: Essencialmente egoísta" e "o velho hábito se dispara" nesse caso.

    Mas ainda prefiro não os reler... Ou pelo menos não o fazer com muita frequência.

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